Durante o mês de Janeiro os alunos do 10º ano L visitaram a Morada da Escrita, no âmbito da disciplina de Filosofia, sob a coordenação da prof. Manuela Macedo, a fim de tomarem conhecimento sobre a exposição que Dias de Melo andava a organizar sobre a sua vida e obra, antes de deixar o mundo dos mortais. Visitar a exposição foi passar em revista a vida do escritor picaroto, homem determinado, curioso e atento ao que se passava à sua volta e combatente convicto utilizando o poder da escrita para denunciar as injustiças sociais, em especial daqueles que apenas tinham a força do trabalho para sobreviver. Ele foi o porta-voz das alegrias e tristezas, dos sonhos e frustrações dos baleeiros do Pico. Herdeiro do sangue baleeiro também ele foi baleeiro, pois “quem nasce em terra de baleeiro, torna-se baleeiro”, afirma o escritor. E quem nasce baleeiro, morre baleeiro. É por isso que, quem emigra tem como sonho voltar à sua ilha e navegar em botes que partam para a pesca da baleia. E quando a idade a isso não permite há que ficar pelo porto e entrar na casa dos botes a avivar a memória das façanhas vividas pelo próprio na sua juventude ou pelos pais, avós ou bisavós. Histórias que encantam quem as ouve e que de ouvintes aspiramos ser protagonistas, sobretudo quando essas personagens demonstram bravura e heroísmo na luta desigual entre homens , mar e baleias. Mas há histórias que, perante luta desigual entre homem e natureza, acabam em tragédia, histórias essas que povoam a memória para todo o sempre. Foi o caso conhecido por Tragédia do Canal, acidente que se deu entre o Pico e S. Jorge, ocorrido dois anos antes do nascimento do escritor, a 23 de Março de 1923.Os micaelenses não ficaram indiferentes à tragédia: os Bombeiros voluntários de S. Miguel realizaram “…um peditório, a 22 de Abril de 1923, a favor dos sobreviventes de um naufrágio na Ilha do Pico…conseguiram angariar 1902$35” conforme diz Germano Tavares em Notas de um Repórter. Uma pequena fortuna para a época! “Era Mestre José Faidoca oficial de pouco tempo, pensou-se em comprar a 1ª lancha a motor”, então o Mestre e outros nove homens da Calheta do Nesquim decidem deslocar-se ao Cais do Pico para levantarem a lancha a motor e dois botes. Dez homens partem no “Deixa-Andar”, propriedade do Mestre José Faidoca, para o Cais do Pico, lado norte da ilha. No regresso enfrentam a fúria do mar e do vento: os botes afundam, sete homens morrem, a lancha aparece na Ilha Terceira, arrombada e sem motor. Sobrevivem três homens, encontrados ao fim de três dias e três noites, um no Porto Judeu, na Terceira dentro da lancha e dois na Fajã dos Bodes em S. Jorge, no “Deixa Andar”. E na Calheta do Nesquim, todos se lembrarão daquela noite fatídica, que em nome do progresso e contra-vontade de muitos velhos decidem ir buscar a lancha a motor. Mesmo com prenúncio de mau tempo, o capelo a enchapelar a montanha, decidem regressar desafiando o mar e o tempo. Foi este acontecimento trágico que Dias de Melo, por ouvi-lo dos mais velhos, com apenas doze anos quis eternizá-lo em papel. É que Dias de Melo quer ser escritor. A imaginação espicaçada, desde a infância, pela leitura de histórias que a tia Maria Augusta (irmã da mãe) e o tio Jorge faziam nas noites de inverno, nos Feitais, às crianças e adultos que não sabiam ler, estavam a ter as suas repercussões. O menino queria ser escritor. E da tia, “dela ficara o gosto pela leitura”confessa o escritor picaroto. A Tragédia do Canal de S.Jorge será o ponto de partida para o “Mar pela Proa”, obra editada em 1976,embora tivesse sido escrita há dez anos atrás. Fascinado pelo mar e pela caça à baleia as suas primeiras obras (Mar Rubro-1958,Pedras negras-1964 e Mar pela Proa-1976) têm por tema principal a problemática da baleação na Ilha do Pico, em particular as vivências e problemas dos baleeiros da Calheta do Nesquim, pescadores e lavradores quando não havia baleia para pescar. À sua partida Dias de Melo deixou-nos uma vasta obra,”volumes devem andar pelos quarenta”, diz-nos ele na sua autobiografia. Visitar a exposição e rever os objectos pessoais do autor como é o caso da navalha do Mestre José Faidioca, “o Mestre dos mestres”oferecida pela esposa ao escritor, a caneta Parker oferecida ao pai, a colecção de cachimbos e a coberta da almofada de baptismo, bordada pela mãe em 1925, ano do seu nascimento, traz-nos à memória momentos da sua vida e que ele faz referência com bastante regularidade ao logo da sua obra e que o marcaram para o resto da vida como foi o caso da morte da mãe, falecida a 6.8 de 1946.